segunda-feira, 23 de março de 2015

Ajustes: duros, mas necessários

Ilustração: Sergio Ricciuto Conte

Antonio Carlos Alves dos Santos é professor titular de Economia na Faculdade da PUC-SP e conselheiro do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP.

Em apenas dois meses, o Governo Dilma, através do seu Ministro da Fazenda Joaquim Levy, conseguiu organizar um conjunto de medidas que inclui cortes de gastos, elevação de receitas e redução de subsídios, que traduz-se em um ajuste fiscal de R$111 bilhões, necessários ao cumprimento da meta de superávit primário de 1,2% do PIB. Pedra fundamental no processo doloroso, mas necessário, de correção dos desequilíbrios legados pela equivocada política econômica do primeiro mandato da Presidente Dilma.
As medidas com impacto sobre os direitos do trabalhador, como alterações nas regras de acesso ao seguro-desemprego, abono salarial e pensão por morte, não foram, como era de se esperar, aceitas pelo movimento sindical que promete fazer tudo que estiver ao seu alcance para derrubá-las no Congresso. Elas, no entanto, são corretas, e visam corrigir distorções bem conhecidas. Trabalhar por um período curto de tempo, deixar o emprego e solicitar o seguro-desemprego tornou se uma pratica comum que desvirtua totalmente o objetivo do seguro-desemprego e implica em comprometimento de recursos que poderiam ser alocados em outras atividades. No caso da pensão por morte é conhecido o fenômeno popularmente conhecido como viúvas do Viagra ou o casamento no leito de morte para repassar a um membro da família estendida o recurso que seria perdido como o falecimento do ente querido. A proposta do governo é adequada à realidade do país e bem mais generosa que a adotada em países do mesmo nível de renda.
Uma outra medida polêmica é a redução dos subsídios. Argumenta-se que ela levaria à redução na criação de postos de trabalhos e ao encarecimento de itens importantes na cesta de bens consumidos pelas classes menos favorecidas da sociedade. Pesquisas, no entanto, demonstram que quando há aumento na oferta do número de empregos com base em subsídios, ele ocorre a um custo tão elevado que sairia muito mais barato repassar os recursos diretamente aos trabalhadores. No caso de subsídios de tarifas públicas os maiores beneficiários acabam sendo os consumidores de maior renda, que fazem maior uso destes serviços, por possuírem um número maior de automóveis, utensílios elétricos, etc.
A medida provisória com alteração na desoneração da folha de pagamentos - cujo impacto na geração de empregos é no mínimo controverso - encontrou forte oposição dos setores que dela se beneficiam e foi rejeitada pelo presidente do Senado Renan Calheiros, obrigando o governo a enviar ao Congresso um projeto de lei com urgência institucional. As consequências da decisão se fizeram sentir de imediato e em nada ajudam no processo de recuperação da credibilidade do país junto às agências de risco. Com esta decisão temerária, ele atrasa o início da reversão da desoneração da folha e poderá até mesmo comprometer todo o esforço fiscal proposto pelo Ministro Levy. Não podemos esquecer que o sucesso do ajuste fiscal é fundamental para que o país mantenha o “chamado grau de investimento” das agências de classificação de risco.
É preciso tomar cuidado para que o ajuste fiscal não coloque em risco os programas sociais que atendem os mais pobres, como o Brasil Sem Miséria e o Bolsa Família. Seria um grande equívoco reduzir a alocação de recursos para estes e outros programas que obtiveram grande sucesso na redução da pobreza absoluta. Eles serão ainda mais importantes ao longo deste processo doloroso de colocar a casa em ordem. Os pobres e os mais necessitados não podem arcar com os custos do ajuste e serem rebaixados para o mesmo nível em que se encontravam em 2010.

Jornal “O São Paulo”, edição 3042, de 11 a 17 de março de 2015.

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