Ilustração: Sergio Ricciuto Conte |
Carlos A. O. Camargo é vice-diretor da Caritas Arquidiocesana de São Paulo e membro do Pontifício Conselho Cor Unum.
É notícia corrente nos veículos de comunicação que milhares
de pessoas estão abandonando seu próprio país com propósitos legítimos de
buscar proteção à sua vida. Qualquer pessoa que consegue chegar a uma fronteira
pedindo proteção tem o direito de – e precisa – ser acolhida prontamente. A
horrenda tragédia a que são submetidos esses refugiados é fruto de graves
estruturas de injustiça social, que atiçam conflitos de diversas naturezas ao
redor do mundo.
A Igreja Católica considera a ajuda aos refugiados uma
obrigação sua essencial, lembrando a responsabilidade evangélica de oferecer
asilo aos que o procuram: "todas as vezes que fizestes isto a um destes
mais pequenos, que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes!" (Mt 25,40). A ajuda deve se estender para além do estritamente material
e não se limitar ao simples fazer algo, mas envolve a participação solícita nas
necessidades e no sofrimento do outro. Nesse sentido, no âmago da ação
caritativa há um dar-se a si mesmo, isto é, a própria pessoa está presente na oferta
àquele que recebe sua atenção, dando testemunho fértil e coerente da fé manifestada
num amor que percebe a presença de Cristo nessa relação.
A Caritas Arquidiocesana, através do seu Centro de
Referência para Refugiados, é o órgão da Igreja Católica de São Paulo que cuida
dos primeiros passos da assistência à maior parte das pessoas que chegam ao Brasil
pedindo a proteção que lhe é legalmente garantida pela sua condição de solicitante
de refúgio. É um trabalho desenvolvido junto com o Alto Comissariado das Nações
Unidas para o Refugiado (ACNUR) e o Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE),
além da indispensável colaboração de várias outras entidades. Esse serviço
objetiva garantir a assistência, proteção e integração dos refugiados nas
estruturas da sociedade, contribuindo para que resgatem sua autoestima e revelem suas próprias
habilidades, para que se tornem independentes e respeitados onde estabelecerem
sua nova vida.
Entretanto, o interesse em compreender e ajudar a aliviar o
sofrimento dos que chegam solicitando o refúgio contrasta, às vezes, com o medo
do excessivo aumento numérico deles, pois isso passa a provocar uma impressão
de confronto com culturas estranhas, que poderiam perturbar os hábitos de vida
já estabelecidos na sociedade que os recebe. Os que antes eram vistos com
simpatia ou compaixão, mas moravam em lugares longínquos, passam a ser inoportunos e rejeitados, quando
se tornam demasiadamente vizinhos.
Além disso, parte do preconceito também ocorre por que os refugiados são
indevidamente responsabilizados, às vezes inconscientemente, por algum dano que
eles eventualmente teriam provocado na sua terra de origem, ou que poderiam vir
a provocar em sua nova terra de acolhida.
Talvez esses estrangeiros recém-chegados e que pretendem
construir uma nova vida por aqui, depois de penosa jornada, pudessem ser mais
bem compreendidos se os meios de comunicação divulgassem os diversos exemplos reais
de acolhimento fraterno surgidos da generosidade humana, de forma a repercutir
na opinião pública como uma atenção positiva de maior tolerância. De fato, a
capacidade do convívio entre as pessoas, independentemente de suas
especificidades que podem distinguir umas das outras, está estritamente ligada
ao desenvolvimento de uma mentalidade de acolhimento, fundado na caridade, que
deve ser suscitada, quer na intimidade de cada uma, quer no senso comum da
coletividade.
Jornal "O São Paulo", edição 3074, de 21 a 27 de
outubro de 2015.
muito obrigado Carlos pelo belo, sensível e esclarecedor artigo. Jose Mario
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