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Ilustração: Sergio Ricciuto Conte |
Francisco Borba Ribeiro Neto,
coordenador do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP.
A recente reforma trabalhista, quer seja boa ou má, abriu
brechas perigosas no reconhecimento dos direitos de alguns profissionais, entre
os quais os professores. É um problema social grave, pois essa categoria
enfrenta más condições de trabalho, num setor vital, no qual o desempenho do
País tem sido muito fraco.
A recente paralisação dos professores da rede particular,
pleiteando a manutenção de direitos trabalhistas há muito reconhecidos e que
agora estão em risco, não é apenas a defesa corporativa de uma categoria. É uma
luta pela qualidade da formação das novas gerações e pelo futuro do País.
Contudo, minha mãe, docente do Ciclo Fundamental, dizia que
professores podiam protestar, mas não deviam fazer greve porque as crianças não
eram culpadas dos erros dos adultos e não podiam ter sua formação comprometida.
Na Faculdade de Ciências Sociais, no período da ditadura, um dos professores
mais engajados e coerentes nos chocou dizendo que operários e trabalhadores do
setor produtivo faziam greve, mas professores e estudantes, quando queriam
mudar o mundo, ensinavam e estudavam mais ainda.
Vinham de uma época na qual a docência era vista como
sacerdócio leigo. Para minha mãe, de um culto cristão do amor aos pequenos.
Para meu professor, de um culto iluminista de emancipação pelo saber.
Numa sociedade cada vez mais mercantilista e individualista,
os professores “se conscientizaram” que esse sacerdócio era uma ilusão da
ideologia capitalista. Somos – por que eu também sou um professor de hoje –
apenas trabalhadores assalariados, que têm de lutar por seus direitos contra os
desmandos do mercado capitalista.
Na verdade, tratam-se das duas dimensões do trabalho às
quais aludia São João Paulo II na Laborem
exercens. Em sua dimensão subjetiva, o magistério é uma daquelas profissões
que exigem tal carga de doação pessoal que não podem ser vistas senão como
sacerdócio. Na objetiva, é uma atividade assalariada como todas as demais, num
mundo onde predominam o lucro e a exploração do trabalho.
O drama dos professores reside, na atualidade, na enorme
contradição entre essas duas dimensões. Nossa dignidade pessoal passa pela
dimensão subjetiva, mas também pelo reconhecimento objetivo, que se concretiza
em salários e condições de trabalho.
Os docentes que mantêm esse valor subjetivo do magistério
(que são a maioria), quando convocados para paralisações e greves ficam
divididos entre esse senso de dever e a necessidade de ter suas reivindicações
ouvidas e atendidas.
Um problema adicional: a educação dos menores é um serviço
essencial até porque os pais que trabalham não têm onde deixar seus filhos
durante as paralisações. E as paralisações em serviços essenciais tendem a
criar mais hostilidade do que empatia com as categorias paradas.
O equilíbrio entre todos esses fatores é o desafio que se
coloca ás lideranças dos movimentos docentes. A história recente traz exemplos
tanto de sucesso quanto de fracasso na busca desse equilíbrio e, em
consequência, no êxito do movimento.
Para os católicos, é um desafio e uma oportunidade. Sendo
tanto empregados quanto empregadores, são chamados a encontrar as formas
adequadas de conciliar essas duas dimensões do trabalho docente, enfrentando
com criatividade os desafios do mercado e da conjuntura.
Não há boa educação sem bons professores. A sociedade
precisa encampar as justas reivindicações dos professores e fortalecer os
movimentos e organizações pró educação que vem crescendo no Brasil.
Em ano eleitoral, não custa perguntar: você vai votar em
candidatos que de fato apoiarão os professores e a melhoria da educação?
Jornal "O São Paulo",
edição 3201, 5 a 12 de junho de 2018.