quinta-feira, 7 de julho de 2016

Brexit e a União Europeia

Ilustração: Sergio Ricciuto Conte

Antonio Carlos Alves dos Santos é professor titular de Economia na Faculdade da PUC-SP e conselheiro do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP.

A escolha dos eleitores britânicos pela saída da União Europeia é, sem duvida alguma, um duro golpe no projeto de integração do velho continente. No entanto, não é o primeiro, e dificilmente será o último, no longo e tortuoso caminho de superação de um passado cuja melhor síntese, negativa, é a sangrenta batalha de Somme, na Primeira Guerra Mundial, iniciada em 1 de julho de 1916. A memória da carnificina (cerca de 1,2 milhões de mortos e feridos numa disputa por 300 km2) ajuda a compreender a importância do projeto na história da Europa.
O processo de integração não é um projeto exclusivamente econômico. Ele é, acima de tudo, um projeto político em busca de fundamentos econômicos. Ele nasce da iniciativa de uma geração de notáveis políticos cristãos, na qual se destacam os católicos Adenauer e De Gasperi e deve à liderança do católico Delors a superação de vários problemas que impediam o progresso da integração econômica.
A incorporação do conceito de subsidiariedade no Tratado de Maastricht atesta a influência da Doutrina Social Católica na proposta de integração europeia. Subsidiariedade é o princípio segundo o qual as instâncias políticas mais amplas devem estar a serviço das subalternas (a união continental a serviço dos países, a federação a serviço dos estados, o governo a serviço sociedade organizada).
A vitória do Brexit no referendo é o desfecho de uma relação nada amigável entre o Reino Unido e os demais parceiros da União Europeia que remonta ao início do projeto de integração europeu. O Reino Unido sempre foi favorável à integração econômica, mas era reticente a qualquer forma de integração política, o que o levou a participar da criação da Associação Europeia de Livre Comércio, uma alternativa ao projeto de Mercado Comum. Além disso, por ter uma relação especial com os Estados Unidos, sempre manteve, segundo De Gaulle, uma relação de hostilidade em relação o projeto de integração europeu. Motivo, aliás, alegado por ele, para vetar a candidatura do Reino Unido ao bloco em 1961: foi aceito somente em 1973 e foi aprovado por 67% dos votantes no referendo de 1975. A opção, em 1992, por ficar fora da Zona do Euro é a melhor expressão desta relação de tapas e beijos entre britânicos e demais parceiros da União Europeia.
Em que pese o fato de ser uma relação difícil, ela não necessariamente teria que terminar no divórcio do Brexit. Erros foram cometidos de ambos os lados: a burocracia europeia deveria ter levado mais a sério o princípio da subsidiariedade e os políticos britânicos deveriam ter sido menos beligerantes com a União Europeia. A insistência em imputar à tecnocracia europeia a responsabilidade por problemas econômicos e sociais britânicos ajudou a criar um caldo de cultura anti- União Europeia em segmentos da sociedade britânica fortemente atingida pela crise econômica. Para eles, a livre circulação dos trabalhadores da União Europeia – um dos pilares de todo projeto de integração econômica – era responsável pelo aumento da criminalidade, baixa oferta de empregos, pela longa espera por tratamentos no Sistema Nacional de Saúde.
O desafio, agora, é conter as danosas consequências econômicas do Brexit. Os maiores prejudicados serão justamente os que optaram pela saída, já que a recessão no Reino Unido dificilmente poderá ser evitada. O impacto no resto da Europa será menor, mas implicará em crescimento abaixo do esperado e poderá ser sentido com mais força nos países mediterrâneos.
Jornal "O São Paulo", edição 3110, 13 a 19 de julho de 2016.

Um comentário:

  1. Parece que a gente não quer aprender das lições da historia recente: quasse toda Europa com dois guerras mundiais em seu território com as principais cidades desbastadas pelo bombardeios, com os campos de extermínio de Auschwitz, e ainda assim duvidam que o caminho da Cultura da Vida, em troca da Cultura da Morte a integração, onde o Planeta Terra e nossa mai Pátria Grande e todos somos cidadãos planetários conforme ao sono Kantiano da Paz Perpetua.

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