segunda-feira, 20 de junho de 2016

A cidade, as eleições municipais e a “cultura do encontro”

Ilustração: Sergio Ricciuto Conte
Klaus Brüschke, é membro do movimento dos Focolares, ex-publisher da Editora Cidade Nova, articulista da revista Cidade Nova.

Neste ano teremos eleições municipais. Os partidos políticos já afiam facas na disputa da cadeira de prefeito e abrem suas portas a candidatos a candidatos a vereador…
O legislador foi sábio ao destacar essas eleições daquelas federais e estaduais. A importância política da cidade é única. É nela que moramos, trabalhamos, nos locomovemos, estudamos, nos divertimos… É a cidade o espaço onde nos encontramos e desencontramos, crescemos em meio a possibilidades e obstáculos, exercitamos nossa identidade e diversidade. É o lugar privilegiado em que acontece a “cultura do encontro”, preconizada por papa Francisco.
Pio XII dizia que a política é a forma mais alta da caridade. E Chiara Lubich, a fundadora do Movimento dos Focolares, explicava: “A tarefa do amor político é criar e proteger as condições que permitem a todos os outros amores florescer: o amor dos jovens que desejam se casar e precisam de casa e trabalho, o amor de quem quer estudar e precisa de escolas e livros, o amor de quem se dedica à própria empresa e precisa de estradas, ferrovias, regras certas. A política é, portanto, o amor dos amores, que recolhe, na unidade de um desígnio comum, a riqueza das pessoas e dos grupos, consentindo a cada um realizar livremente a própria vocação… A política pode ser comparada ao pedúnculo de uma flor, que apoia e nutre o renovado desabrochar das pétalas da comunidade”.
As questões da nossa cidade – como os espaços de convivência, de cultura e de lazer, a mobilidade e a segurança, o desenvolvimento urbano, a gentrificação e a sustentabilidade, os recursos naturais e aqueles financeiros, as imbricações com o entorno em nível estadual, nacional e mesmo internacional etc. – podem ser tratadas tendo as relações fraternas como critério norteador e de avaliação. Relações capazes de fazer dos habitantes um “corpo político” que ultrapassa a esfera da utilidade material e alcança a dimensão do bem comum, como já ensinava Aristóteles. Relações que, para os cristãos, se inspiram no fato de nos reconhecermos todos filhos de um único Pai e irmãos uns dos outros, reconhecimento que não se limita à esfera religiosa, mas se traduz em participação, iniciativas, projetos, leis, instituições, enfim, em “cultura política”.
Por isso também, três cuidados precisam ser tomados nestas eleições municipais: 1) que elas não se contaminem pela crise política federal e pelas narrativas dos diversos grupos políticos; 2) que não se caia num sebastianismo: como no século XVI os portugueses esperavam a volta do rei d. Sebastião, morto em batalha, para conduzir o país à glória, pode-se esperar por um candidato brilhante, que livre a cidade de todos os seus males; 3) que não se descuide da escolha dos vereadores, a partir do cardápio oferecido nos programas eleitorais gratuitos, em que candidatos prometem segurança, saúde, educação, emprego…
O período pré-eleitoral é, pois, um ensejo oportuno para debatermos, articuladamente, o projeto de cidade que almejamos, e o confrontarmos com os programas dos partidos e dos candidatos.
Dessa forma, votar não será o mero uso de nossa soberania popular para transferir o poder a alguém que, em nosso nome, encontre soluções para nossos problemas. Será uma das formas – ao lado de tantas outras – de expressarmos a cidadania, a corresponsabilidade por nosso destino comum.
Jornal "O São Paulo", edição 3106, 15 a 21 de junho de 2016.

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