Ilustração: Sergio Ricciuto Conte |
Neste ano teremos eleições municipais. Os partidos políticos
já afiam facas na disputa da cadeira de prefeito e abrem suas portas a
candidatos a candidatos a vereador…
O legislador foi sábio ao destacar essas eleições daquelas
federais e estaduais. A importância política da cidade é única. É nela que
moramos, trabalhamos, nos locomovemos, estudamos, nos divertimos… É a cidade o
espaço onde nos encontramos e desencontramos, crescemos em meio a
possibilidades e obstáculos, exercitamos nossa identidade e diversidade. É o
lugar privilegiado em que acontece a “cultura do encontro”, preconizada por
papa Francisco.
Pio XII dizia que a política é a forma mais alta da
caridade. E Chiara Lubich, a fundadora do Movimento dos Focolares, explicava:
“A tarefa do amor político é criar e proteger as condições que permitem a todos
os outros amores florescer: o amor dos jovens que desejam se casar e precisam
de casa e trabalho, o amor de quem quer estudar e precisa de escolas e livros,
o amor de quem se dedica à própria empresa e precisa de estradas, ferrovias,
regras certas. A política é, portanto, o amor dos amores, que recolhe, na
unidade de um desígnio comum, a riqueza das pessoas e dos grupos, consentindo a
cada um realizar livremente a própria vocação… A política pode ser comparada ao
pedúnculo de uma flor, que apoia e nutre o renovado desabrochar das pétalas da
comunidade”.
As questões da nossa cidade – como os espaços de
convivência, de cultura e de lazer, a mobilidade e a segurança, o
desenvolvimento urbano, a gentrificação e a sustentabilidade, os recursos
naturais e aqueles financeiros, as imbricações com o entorno em nível estadual,
nacional e mesmo internacional etc. – podem ser tratadas tendo as relações
fraternas como critério norteador e de avaliação. Relações capazes de fazer dos
habitantes um “corpo político” que ultrapassa a esfera da utilidade material e
alcança a dimensão do bem comum, como já ensinava Aristóteles. Relações que,
para os cristãos, se inspiram no fato de nos reconhecermos todos filhos de um
único Pai e irmãos uns dos outros, reconhecimento que não se limita à esfera
religiosa, mas se traduz em participação, iniciativas, projetos, leis,
instituições, enfim, em “cultura política”.
Por isso também, três cuidados precisam ser tomados nestas
eleições municipais: 1) que elas não se contaminem pela crise política federal
e pelas narrativas dos diversos grupos políticos; 2) que não se caia num
sebastianismo: como no século XVI os portugueses esperavam a volta do rei d.
Sebastião, morto em batalha, para conduzir o país à glória, pode-se esperar por
um candidato brilhante, que livre a cidade de todos os seus males; 3) que não
se descuide da escolha dos vereadores, a partir do cardápio oferecido nos
programas eleitorais gratuitos, em que candidatos prometem segurança, saúde,
educação, emprego…
O período pré-eleitoral é, pois, um ensejo oportuno para
debatermos, articuladamente, o projeto de cidade que almejamos, e o
confrontarmos com os programas dos partidos e dos candidatos.
Dessa forma, votar não será o mero uso de nossa soberania popular
para transferir o poder a alguém que, em nosso nome, encontre soluções para
nossos problemas. Será uma das formas – ao lado de tantas outras – de
expressarmos a cidadania, a corresponsabilidade por nosso destino comum.
Jornal "O São Paulo", edição 3106, 15 a 21 de junho
de 2016.
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