Ilustração: Sergio Ricciuto Conte |
Marli Pirozelli N. Silva, historiadora, mestre em Filosofia da Educação, é professora de Doutrina Social da Igreja no Centro Universitário da FEI e coordenadora do Centro Cultural Abaré.
A caridade – caritas
– sempre esteve no centro da vida da Igreja. As inúmeras obras sociais surgidas
ao longo dos séculos demonstram que a caridade nunca foi compreendida como um
serviço complementar à fé, mas sim como expressão da própria natureza do cristianismo.
Foi no fluxo de vida nova trazida pelo cristianismo que
floresceram as primeiras iniciativas de cuidado e proteção aos doentes, aos
mortos insepultos nos tempos de pestes e aos famintos. Desta forma, foram se
estruturando grandes obras sociais, tais como as Santas Casas, que desafiam o
tempo, adaptando-se e renovando-se para atender às novas demandas sociais.
O lançamento do livro de Pe. Antonio Pucca, As Santas Casas de Misericórdia, de Florença
a São Paulo, a epopeia da caridade (São Paulo: Companhia Ilimitada, 2015)
lança luz sobre a Santa Casa de São Paulo, cujas origens remontam à Irmandade
de Misericórdia de Florença, criada em 1244, passando depois pela fundação da
Misericórdia em Portugal até chegar às terras brasileiras. A primeira Santa Casa
de Misericórdia brasileira foi fundada em Olinda, em 1539. Seguiram-se então as
Santas Casas de Salvador, Santos, Rio de Janeiro e São Paulo, esta última uma
referência nacional no atendimento à saúde. O livro ilustra a abrangência
mundial destas obras com algumas obras sociais nos EUA (charities) e traz exemplos
de outras obras de caridade brasileiras atuais, nas quais o cuidado com o outro
supera os desafios e os as limitações econômicas.
Os números das Santas Casas do Brasil são impressionantes:
respondem por 2/3 dos leitos hospitalares do país e ao menos 60% dos seus
serviços são dedicados aos pobres. Somente a Santa Casa de São Paulo realiza
730.000 atendimentos ao ano, sendo reconhecida também pela excelência em ensino
e pela qualidade de seus centros de pesquisa e tratamento, apesar dos atuais
problemas gerados pela falta de recursos.
Assim como outras obras de caridade, nascidas da iniciativa
de pessoas e grupos empenhados na busca de soluções eficazes para os problemas
sociais, as Santas Casas atuam silenciosamente no dia a dia, socorrendo as
necessidades dos mais pobres, valorizando a dignidade humana e promovendo o
desenvolvimento social.
Estas instituições constituem uma verdadeira riqueza social.
Cabe ao Estado valorizá-las e protegê-las por meio de ações subsidiárias e de
uma legislação adequada, para que possam se desenvolver de forma autônoma. A
Doutrina Social da Igreja nos ensina que o Estado deve atuar de acordo com o
princípio da subsidiariedade, valorizando a liberdade, a iniciativa e a
responsabilidade da sociedade na solução de seus problemas e na condução do
desenvolvimento, auxiliando os grupos sociais sem substituí-los ou torná-los
dependentes. O Estado brasileiro deve reconhecer o papel decisivo que estas
obras desempenham no fortalecimento da sociedade, pois atuam diretamente na
construção do Bem Comum, cuidando do interesse coletivo e desempenhando uma
função pública, embora não estatal.
Instituições como a Santa Casa não oferecem a solução para
todos os problemas sociais, mas constituem uma expressão visível da caridade,
da qual nasceram. São lugares onde a pessoa pode sentir-se amada e dar-se conta
do próprio valor, onde a dor e sofrimento encontram conforto e esperança. São sinais
vivos da presença de Deus, um farol que ilumina a vida de todos os que chegam
até elas em busca de acolhida, assim como a de toda a sociedade.
Jornal "O São Paulo", edição 3067, de 02 a 08 de
setembro de 2015.
Cara Marli li nas páginas amarelas da Veja de 19 de agosto a frase de Cézar Hidalgo:só a educação é pouco e o físico do MIT diz que o grande motor do desenvolvimento é a capacidade da sociedade de armazenar e processar o conhecimento.Quando vc fala em subsidiariedade vejo uma forma interessantíssima de armazenar e processar o conhecimento ajudando o bem comum.
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