Ilustração: Sergio Ricciuto Conte |
O plebiscito de 5 de julho, foi mais um capítulo na longa e
emocionante novela em que se transformou a relação entre a Grécia e a chamada
troica: Banco Central Europeu (ECB), Fundo Monetário Internacional e Comissão
Europeia. A vitória esmagadora do não à última proposta de socorro apresentada
pela troica foi uma surpresa para a maioria dos políticos europeus e os coloca
em mares nunca navegados.
A situação delicada em que se encontra a economia grega é o
resultado da irresponsabilidade da sua elite política que sempre gastou mais do
que arrecadava e chegou ao desplante de forjar os dados sobre a sua real
situação fiscal. O mercado sabia que as estatísticas oficiais gregas não eram
um primor, mas nem por isto os bancos europeus, principalmente alemães e
franceses, deixaram de emprestar à Grécia. Quando o governo grego, expos a real
situação das finanças públicas do país, esses bancos ficaram em situação de
fragilidade e, caso a Grécia der o calote, os contribuintes alemães e franceses
é que pagarão a conta.
A elite política grega foi, sem dúvida alguma, irresponsável
e a ela cabe a maior parcela da culpa pelo desastre grego, mas os seus
credores, particularmente estes bancos, também tem culpa no cartório. Ambos, no
entanto, saíram ilesos e repassaram a conta para a população de baixa renda
grega, em uma manobra que entra para a longa lista da conhecida prática de
lucros privados e prejuízos socializados.
O primeiro socorro à Grécia foi, na verdade, um socorro aos
bancos franceses e alemães. O governo grego recebeu recursos financeiros para
honrar as dívidas que tinha com esses bancos e permitir que eles ganhassem
tempo para reduzir a sua exposição no mercado financeiro grego. Os ricos países
do norte europeu, aproveitaram a oportunidade para obrigar o governo grego a
implementar reformas estruturais importantes como privatizações, mudanças na aposentadoria,
redução do número de funcionários. Em outras palavras, em troca dos recursos necessários
para salvar os bancos, a população grega foi obrigada a aceitar uma dose
cavalar de medidas de austeridade que resultaram em queda brutal do produto
interno bruto (PIB), aumento do desemprego e da pobreza.
O segundo socorro insistiu em medidas de austeridade, sem
oferecer nenhuma contrapartida que beneficiaria a maioria da população. Criou o
ambiente propicio ao fortalecimento político de partidos com posições extremas
à direita e à esquerda. A vitória eleitoral do Syriza ocorreu justamente, em um
momento em que, pela primeira vez, em anos, a Grécia estava arrecadando mais do
que gastava. Isto, apesar do governo não ter implementado várias medidas de
reformas estruturais demandadas pela troica. É preciso reconhecer que tais
medidas eram e são necessárias para tornar a economia grega mais eficiente e
competitiva.
O Governo liderado pelo Syriza, infelizmente, optou pelo
caminho mais fácil de reversão de políticas que haviam permitido o aumento na
arrecadação fiscal e que, com as devidas correções, poderiam colocar a Grécia
no caminho do crescimento sustentável com justiça social. Ele acertou, no
entanto, em demandar a redução na dívida grega com os credores, assim como na
sua reestruturação.
A forte oposição liderada pela Alemanha à redução e
reestruturação da dívida grega é um comportamento triste, exemplo de memória
seletiva: esquece que mais da metade da sua dívida foi perdoada em 1953. Essa
medida e os recursos do Plano Marshall criaram as condições necessárias para o
famoso milagre econômico alemão.
Jornal "O São Paulo", edição 3060, de 15 a 21 de
julho de 2015.
Leia também:
Maus ventos para a economia
Leia também:
Maus ventos para a economia
Nenhum comentário:
Postar um comentário