Ilustração: Sergio Ricciuto Conte |
Marcelo Musa Cavallari
Estamos andando para trás. O progresso que se louva na
destruição da moral sexual que até algumas décadas atrás servia de fundamento
para o Ocidente Cristão não é uma novidade. Estamos de volta ao mundo de
Petrônio, o autor romano que descreveu, em seu Satyricon, um mundo de
festas ininterruptas em que comer em quantidade comidas altamente sofisticadas,
beber até perder o controle e fazer sexo sem peias era a única norma.
A semelhança dessa descrição com a premissa básica de um sem
número de reality-shows que pululam hoje na TV não é uma coincidência. O
sucesso desses programas se deve, em grande medida, à possibilidade de assistir
ao que é tido como o ideal inacessível da vida humana hoje: a diversão infinita
que o excesso de recursos criado pelo capitalismo e a possibilidade
tecno-científico-industrial de separar atos de suas consequências tornou
possível, ainda que não para a grande maioria dos mortais.
A verdadeira revolução sexual, porém, ocorreu muito antes da
pílula. A verdadeira revolução sexual foi a integração do sexo no cerne da
pessoa humana promovida pelo seguimento de Jesus Cristo. A partir daí, para os
cristãos, o sexo deixou de ser apenas uma poderosa pulsão que os humanos têm em
comum com boa parte dos animais para ser elemento essencial do destino final de
homens e mulheres. O casamento, instrumento necessário para organizar o
aparecimento das novas gerações e a participação delas na vida da comunidade,
deixou de ser uma instituição humana. O homem e a mulher casados na Igreja não
estão comprometidos por um contrato. Tiveram, isso sim, sua natureza alterada
diante de Deus e por graça d’Ele. Tornaram-se “uma só carne”, como diz o livro
do Gênesis. Isto é: um só destino.
Essa visão virou de cabeça para baixo o mundo dominado pelos
hábitos sexuais dos poderosos romanos, os senhores da Terra então, grandemente influenciados
pelos gregos e sua homossexualidade masculina obrigatória. E fez isso com a
humildade do Crucificado. Jesus nasceu sob duas esferas de poder: uma nacional,
os judeus, e outra estatal, o Império Romano. Foi condenado à morte pelas duas.
Os cristãos, clandestinos no Império Romano, propagaram o seguimento de Jesus,
e a revolução sexual que esse seguimento implicava. Impressionavam pela
mansidão, e a sua recusa em fazer parte da desbragada festa em curso no Império
Romano era tão chocante e imperdoável quanto sua resistência a sacrificar aos
ídolos.
O sexo livre de significado espiritual e moral, mas
carregado do jogo de poder que se praticava no Império Romano está de volta. O
exercício sem peias do prazer sexual serve para obtenção e exercício do poder
sob a forma de sedução, assédio ou resistência a ambos; para ganhar dinheiro;
para conceder ou exigir favores; ou para simples diversão, como se nesta vida
fugaz houvesse tempo para ser matado.
Os neo-romanos estão obviamente no poder e os seguidores de
Jesus precisam continuar corajosamente fieis ao que lhes foi transmitido. A
mansidão que revirou de cabeça para baixo o Império Romano tinha sua mais alta
expressão no martírio. Como acentuou o papa Francisco, há mais mártires hoje do
que em todas as épocas da história da Igreja. É no exemplo deles que derramam
seu sangue em países muçulmanos e comunistas recusando qualquer compromisso,
que os cristãos devem resistir à depravada festa que se impõe ao mundo hoje. Foi,
afinal, o sangue dos mártires que regou a verdadeira revolução sexual.
Jornal "O São Paulo",
edição 3195, 18 a 24 de abril de 2018.
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