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Ilustração: Sergio Ricciuto Conte |
Angela Vidal Gandra Martins é doutora
em Filosofia do Direito (UFRGS) e sócia Advocacia Gandra Martins.
A geração Millenium, contextualizada
na pós modernidade - definida como a era do pensamento débil (pensiero debole) e das relações
líquidas, como bem afirmaram os filósofos Gianni Vattimo e Zygmunt Bauman - é,
de certa forma, um produto do “esgotamento filosófico”, ainda que não tenha
capacidade de identificar as influências que recebe, por falta de reflexão
somada a um despreparo em termos de virtude para viver em um mundo tecnológico.
Entre outras correntes contemporâneas que agem sobre suas
escolhas, na maioria inconsequentes, destacamos três: o existencialismo, o
utilitarismo e o marxismo. Em linhas gerais, o primeiro centra a existência em
si mesmo, onde os outros apresentam-se
como um obstáculo e o ser humano é concebido como uma paixão inútil,
restando a opção de experimentar o momento com diversidade e intensidade,
porém, sob a perspectiva da tragicidade que supõe aceitar a fugacidade da vida,
a ser gasta sem uma meta ou sentido mais profundo, levando mais cedo ou mais
tarde à depressão. O utilitarismo, por sua vez, também de cunho individualista,
reduz o fim existencial à busca do prazer e à fuga da dor a qualquer custo, a
partir de um critério moral relativo e neutro, definindo o ser humano como um
maximizador autointeressado de suas preferências, onde o outro é apenas um meio
para sua própria satisfação. Por fim, o marxismo, travestido de ideal, projeta
falsamente o homem para o coletivo, afogando sua identidade no grupo através da
manipulação ideológica de mentes, muitas vezes bem dispostas, mas sem senso
crítico ou experiência suficiente para posicionar-se com liberdade.
Por outro lado, o déficit educacional tanto no plano
científico quanto no que se refere à forja de um verdadeiro caráter torna a
nova geração frágil e mais controlada do que beneficiada pela tecnologia, por
falta de autodomínio, facilitando a superficialidade, a preguiça mental e a
fragmentação, que também repercute na esfera relacional. De fato, é um paradoxo pensar que na era da
comunicação globalizada seja tão difícil cultivar uma boa e constante relação
pessoal com os demais, ou, simplesmente, mantê-la.
Porém, não se pode subestimar a capacidade humana de desejar
a verdade e sua rejeição à mediocridade. De fato, é só oferecer um panorama
mais elevado e percebe-se o deslumbramento. No início deste ano, por exemplo,
organizamos um curso de verão para alunos de diversificadas áreas denominado
“Reflexões Críticas sobre o trabalho e a boa vida”, entendendo-se “good life” como vida plena. E concluímos
que Aristóteles tem realmente muito a nos ensinar sobre o que são realmente os
bens básicos para a felicidade humana: a excelência própria; a amizade e a
verdade, até chegar à “source” ou
fonte das respostas mais importantes sobre o sentido da vida e a própria
missão.
Apostamos que a
geração Millennium, tão bem servida
de meios, também pode ser atraída por estes fins e dispor-se a abrir-se ao
outro e construir uma sociedade mais justa. Basta que os ajudemos a refletir
com maior profundidade e superar-se, vencendo a vontade fraca e escrava de
caprichos. Como dizia Santo Agostinho, “os tempos somos nós” e comprovou com
sua vida: refletiu, mudou, transformou seu entorno e deixou um legado para toda
humanidade. Os Millenniums também podem ser divergentes, e contra qualquer
conformismo, desafiar seu próprio tempo. Cabe aos pais, educadores e
professores oferecerem a plataforma.
Jornal "O São Paulo", edição 3167, 20 a 26 de
setembro de 2017.
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