Ilustração: Sergio Ricciuto Conte |
Jair Militão da Silva é pedagogo, mestre em Filosofia da Educação pela PUC-SP, doutor e livre docente em Educação pela USP, membro da Academia Paulista de Educaçção e conselheiro do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP .
O Papa Bento XVI por ocasião de um seu pronunciamento sobre
a situação das crianças e dos jovens da Itália falou da existência de uma
“emergência educativa”. Penso que este conceito, pode prestar-se para um
efetivo exame das políticas públicas de educação em nosso país e em muitos
outros. Esta situação é real ou exagerada pelas lentes da mídia? Infelizmente,
uma consulta aos professores de ensino básico no Estado de São Paulo feita pela
APEOESP e pelo Instituto Data Popular confirma a existência da violência dos
jovens, do egoísmo das crianças e da omissão do adulto. O aprendizado de como
viver a própria humanidade pelo educando necessita do encontro com outro ser
humano, autenticamente humano, diante do qual possa espelhar-se e constituir
sua identidade. Estamos diante de uma emergência educativa que, para ser bem
equacionada, necessita dramaticamente da humanização dos educadores e dos
processos educativos.
Educar é propor um horizonte para a vida toda do educando e
sempre é uma aposta antropológica, ou seja, repousa em uma visão de homem cujo
núcleo básico é a crença de que cada ser humano possa aperfeiçoar-se.
Em uma perspectiva humanista integral, tal como a História mostra,
o homem tem como pontos constituintes a razão e a capacidade de amar.
Pela razão o homem é capaz de compreender as situações em
que se encontra e “ler” os acontecimentos à luz de princípios e valores. A
razoabilidade das leituras do mundo pode ser aferida pelo diálogo que surge
quando a razão é aplicada como forma de viver e partilhar os diversos problemas
que a vida apresenta, superando a violência “sem razão”.
A formação da identidade acontece ao longo da vida de cada
homem e tem como condicionantes o tempo, o espaço, as relações interpessoais,
as heranças biológicas.
Em nossa cultura atual, com formas de atender aos desejos de
modo quase imediato, tendo em vista a presença dos produtos prontos, das
comunicações instantâneas, ocorre a sensação de que o condicionante temporal
foi superado. Não dependeríamos mais do tempo para realizar nossos desejos e a
“instantaneidade” nos leva a esquecer de que a formação da identidade humana
acontece com uma duração temporal necessária. Igualmente, são necessárias
práticas que se consolidem para formar uma identidade, que se
institucionalizem, ou seja, que se tornem hábitos em cada pessoa e em cada
grupo e, para isso, os rituais são fundamentais.
Grandes educadores criaram processos educativos que levaram em
conta estas dimensões de tempo, espaço, ritmo humano, limites e possibilidades
das pessoas. Como exemplo disso, pode ser citado São Bento, cuja Regra de Vida
vem orientando a formação de identidades por mais de quinze séculos. Esta Regra
funda-se, entre outras coisas, na organização do tempo, do espaço e das
relações interpessoais.
A experiência da Igreja Católica é rica de conhecimento das
práticas formativas que são efetivamente adequadas aos seres humanos. A
humanização acontecida nas comunidades cristãs, nos diversos movimentos e novas
comunidades pode contribuir para a construção da escola humanizada.
O risco é a criação de um hiato entre “vida de fé” e “vida
social”, ou seja, vive-se fraternalmente no seio da Igreja e não saímos para o
“mundo”, seja para as “periferias existenciais” ou mesmo para a escola de
nossos filhos, sobrinhos, netos ou paroquianos.
Estamos diante de uma emergência educativa que, para ser bem
equacionada, necessita dramaticamente da humanização dos educadores e dos
processos educativos.
Jornal “O São Paulo”, edição 3039, de 19 a 24 de fevereiro
de 2015.
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