segunda-feira, 8 de junho de 2015

Maus ventos para a economia

Ilustração: Sergio Ricciuto Conte

Antonio Carlos Alves dos Santos é professor titular de Economia na Faculdade da PUC-SP e conselheiro do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP.

O anúncio do contingenciamento do Orçamento para 2015 deveria ter sido um momento para reafirmar o compromisso da atual administração com o ajuste fiscal, mas aconteceu exatamente o contrário: a ausência do Ministro Levy, em razão de uma alegada gripe, criou ruídos desnecessários que acabaram chamando mais a atenção que as próprias medidas anunciadas. 
É sempre bom lembrar que o Ministro Levy mal começou o longo e difícil processo de recuperação da credibilidade da política econômica brasileira.  Sem ele este processo será muito difícil, para não dizer impossível. Pior ainda: levaria o mercado a impor a sua própria versão de ajuste fiscal com custos sociais superiores aos deste que está sendo negociado pelo governo Dilma.
Um país que passa por um momento econômico extremamente delicado, como é o nosso caso, requer da sua classe dirigente um comportamento menos autocentrado e mais focado no bem comum. Infelizmente a revisão do fator previdenciário e as difíceis negociações em torno de medidas que alteram a regra para o direito à pensão por morte e os critérios para o acesso a benefícios trabalhistas demonstram o apego a velhas e equivocadas políticas populistas, cuja conta acaba sempre sendo paga pela população de baixa renda.
Os dados macroeconômicos recentes confirmam o que já estamos cansados de saber a respeito das tentadoras políticas econômicas populistas, mas que infelizmente insistimos em ignorar: a bonança inicial cobra um custo social elevado quando se torna impossível ignorar a fragilidade dos seus fundamentos econômicos. É exatamente isto que estamos presenciando no Brasil, com o aumento da taxa de desemprego, queda de renda, fragilidade fiscal e problemas no setor externo, para não mencionar inflação bem acima da meta.
Esse cenário desolador dificilmente será revertido no segundo semestre, ou seja: a oferta de emprego continuará anêmica e a taxa de desocupação continuará subindo. Somente a inflação é que deverá apresentar melhoras, mas mesmo assim deverá fechar o ano em torno de 8%.  O setor externo também deverá continuar patinando, com a balança comercial refletindo a falta de uma política realista para o setor que requereria, por exemplo, maior abertura às negociações com a União Europeia e os Estados Unidos, e isso requer somente maior pragmatismo do governo brasileiro em relação aos parceiros do Mercosul.
O cenário poderá tornar-se ainda mais difícil, se a versão final do ajuste fiscal o tornar ainda mais limitado do que a versão apresentada na semana passada:  o corte nas despesas ficou muito abaixo dos 6% inicialmente propostos; a promessa de gastos equivalentes aos de 2013 foram, aparentemente, deixadas para as calendas.  Já o cenário róseo, marca registrada do primeiro governo Dilma, se fez presente com a expectativa de aumento de arrecadação de impostos, quando o que se verifica é justamente o contrário.  De esperado somente o inevitável corte dos investimentos, em razão do conhecido engessamento do orçamento brasileiro.
Em síntese, não se deve esperar melhoras significativas no cenário econômico brasileiro antes do próximo ano, isto se tudo sair como manda o figurino.  E por isto recomendo ao caro leitor evitar assumir compromissos financeiros que não sejam realmente essenciais. O momento requer cautela e uma administração das despesas da família ainda mais cuidadosa que as que já nos habituamos a fazer nos tempos de vacas magras em nosso país.
 Jornal “O São Paulo”, edição 3054, de 3 a 9 de junho de 2015.

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