segunda-feira, 6 de março de 2017

Família Cristã: aquela que o Estado precisa

Ilustração: Sergio Ricciuto Conte

Claudio José Langroiva é professor do Curso de Direito da PUC-SP, conselheiro do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP, membro da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo e membro do Movimento Equipes de Nossa Senhora.

No Direito, a família converteu-se na maior preocupação do Estado pós-moderno, mesmo considerando características e conceitos desvirtuados nas atuais relações familiares, sob influência do individualismo que cunha a sociedade ocidental atual.
Durante o século XX, houve uma busca da valorização dos direitos e garantias individuais, entre eles os das mulheres, com a valorização individual dos entes familiares, sustentados agora na base constitucional da igualdade e isonomia. A participação isonômica de cada integrante da família, com funções e tarefas diferentes, mas com espaço para o respeito mútuo e a igualdade, tornou-se razão de identificação de afeto e respeito nas relações familiares, sob um novo modelo de Estado Democrático de Direito.
A isso, seguiu-se uma desconsideração da estrutura familiar tradicional, de cunho patriarcal, hierarquizada, em favor de uma instituição democrática.
Assim, a família, base da sociedade, passa a ter a necessidade de ser novamente compreendida, levando-se em conta um novo tecido normativo, que inclui valores éticos que devem se harmonizar com a realidade familiar.
Valores fundamentais restaram obscurecidos pelos conceitos de uma pós-modernidade individualista e dualista, concentrada na preservação dos direitos individuais, esquecendo-se da solidariedade e do humanismo familiar autêntico.
A felicidade a qualquer custo, difundida pelo modelo globalizado de sociedade, dizima famílias frente a uma pregação onde o pacto moral cede espaço para a recusa das regras morais, orientadoras do exercício humano e cristão da sexualidade no matrimônio. Mas essa dualidade que prega o direito individual e o amor de si mesmo confunde nossos pensamentos sobre o amor e não deixa ver a vocação originária e fundamental do ser humano.
Nesse contexto, a identidade da família cristã, superando individualidades estruturais próprias e a dinâmica emocional de cada membro, assume padrões de comportamento, convenções sociais, valores morais, filosóficos e religiosos, que são transmitidos de geração em geração, segundo a base em que ela se sustenta.
“No matrimônio e na família constitui-se um complexo de relações interpessoais – vida conjugal, paternidade-maternidade, filiação, fraternidade – mediante as quais cada pessoa humana é introduzida na ‘família humana‘ e na ‘família de Deus‘, que é a Igreja” (Exortação Apostólica Familiaris Consortio, 15).
Esta realidade de amor é verdadeira fonte de sustento, porque o mundo é assolado pela dispersão dos valores sociais e conjugais, em favor do humanismo individualista, onde os direitos e garantias individuais afastam-se da solidariedade familiar e conjugal.
Contrariamente a tudo isto, o bem-estar social verdadeiro deve passar pela valorização comum dos direitos de cada um, em um conjunto, em uma estrutura familiar, onde a educação amorosa e fecunda, na moral e na ética, são os instrumentos vivos de uma sociedade rica de valores fundamentais para o Estado Democrático de Direito.
A família que o Estado precisa é a família como verdadeira Eclesia, em um conceito de "igreja doméstica", em um resgate das primeiras igrejas que se reuniam em casas de famílias, com pais e filhos recebendo uns dos outros a prática dos preceitos de amor fraterno, de solidariedade e de fraternidade, fundamentos da fé cristã.
Jornal "O São Paulo", edição 3140, 2 a 7 de março de 2017.

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