segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Maria no Sínodo

Ilustração: Sergio Ricciuto Conte
Francisco Catão, teólogo com doutorado pela Universidade de Estrasburgo (França), foi professor no Instituto Pio XI e na Faculdade São Bento, autor de vários livros, tais como "O que é a Teologia da Libertação", "Em busca do sentido da vida" e "Espiritualidade cristã".

Comemorando o Ano Mariano Nacional, o Cardeal Scherer, nosso arcebispo, nos brindou com a carta pastoral Viva a Mãe de Deus e nossa! Na oportunidade dos diversos aniversários marianos deste ano, recorda a doutrina mariana da Igreja, dá orientações detalhadas sobre várias práticas pastorais/devocionais e termina, “invocando, com Nossa Senhora Aparecida, o Espírito Santo, sobre o caminho sinodal da arquidiocese e a graça de um novo vigor evangelizador e pastoral”.
Ao recordar a doutrina, defende a posição católica contra as clássicas objeções da grande maioria das igrejas e denominações protestantes, seguindo o importante capítulo VIII, sobre o lugar de Maria no mistério de Cristo e da Igreja, da Constituição Dogmática sobre a Igreja, Lumen gentium, promulgada pelo Concílio Vaticano II, em 1964.
 Não nos parece, então, inútil relembrar alguns aspectos das longas e, por vezes, apaixonadas discussões entre os padres conciliares a respeito de como situar Maria no mistério de Cristo, exatamente em relação à Igreja.
Forte corrente mariológica dentre eles defendeu, até quase o fim das discussões, que Maria constituía, digamos, um mistério especial. Assim pensavam ora porque tinham uma concepção prevalentemente institucional e canônica da Igreja, ora porque consideravam os privilégios da Mãe de Deus como carismas, no sentido técnico do termo, expressões excepcionais do dom de Deus, em vista da santificação da Igreja.
Foi preciso decidir no voto, se a doutrina sobre Maria deveria se inserir na Constituição sobre a Igreja, tratando-a como membro da Igreja, ou se seria objeto de um documento próprio, dado o lugar particular que ocupa no desígnio salvador de Deus.
Na votação excepcional não se alcançou a maioria regulamentar dos dois terços, mas o papa Paulo VI acolheu a tese de que Maria era a expressão acabada da santidade, membro eminente da Igreja, por estar como ninguém próxima de Deus, como Mãe de seu Filho, santificada por Ele, como todos nós, participantes da mesma santidade.
Todos os cristãos, acolhidos pelo Pai num mesmo Povo, encabeçados por Cristo, filho de Maria, num mesmo Espírito, formamos a Igreja, expressão histórica como que “o sacramento da união com Deus e da unidade de todo o gênero humano”, como diz a mesma Constituição Lumen gentium, que, por isso não podia deixar de incluir Maria.
A Igreja é, antes de tudo, um mistério de santidade, participação na vida de Deus, na qual somos introduzidos pela Palavra de Deus encarnada, Jesus, que nos santifica a todos, por seu gesto salvador de amor, entregando-se na cruz como homem.
A Igreja é obra da graça. A humanidade de Jesus é santa e vem de Maria, “cheia de graça”, valendo-lhe o título de Mãe da Igreja, Mãe do Povo de Deus. A santidade tem primazia sobre todos os dons hierárquicos e carismáticos.
Em clima a de sínodo, não se pode esquecer essa grande lição do Vaticano II, de que a santidade Jesus, graça capital vivida em plenitude por sua Mãe, é o lugar de Maria na Igreja, no mistério cristão.
Jornal "O São Paulo", edição 3170, 11 a 17 de outubro de 2017.

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