Ilustração: Sergio Ricciuto Conte |
Dalton Luiz de Paula Ramos é professor titular de Bioética da Faculdade de Odontologia da USP.
Uma das minhas paixões é saborear a tortinha de morango de certa doceira da cidade. Meus alunos sabem dessa paixão porque em minhas aulas, onde trato de grandes temas éticos, nunca deixo de proclamar minhas convicções pessoais; as gastronômicas, mas, também, as religiosas. Muitas vezes sou questionado sobre essas tomadas de posições em sala de aula, se eu não deveria ser “imparcial”. Aí, contra argumentando, relembro da tal tortinha de morango porque é algo que encontrei na vida e, tendo-a experimentado e provado seu sabor, não posso deixar de anunciar a todos os meus amigos o acontecimento de ter conhecido esse doce.
Uma das minhas paixões é saborear a tortinha de morango de certa doceira da cidade. Meus alunos sabem dessa paixão porque em minhas aulas, onde trato de grandes temas éticos, nunca deixo de proclamar minhas convicções pessoais; as gastronômicas, mas, também, as religiosas. Muitas vezes sou questionado sobre essas tomadas de posições em sala de aula, se eu não deveria ser “imparcial”. Aí, contra argumentando, relembro da tal tortinha de morango porque é algo que encontrei na vida e, tendo-a experimentado e provado seu sabor, não posso deixar de anunciar a todos os meus amigos o acontecimento de ter conhecido esse doce.
E quanto maior a
amizade – portanto, quanto mais eu gosto da pessoa e estou interessado em seu
bem – tanto mais me sinto propelido a lhe anunciar a existência dessa tortinha
maravilhosa: "Você tem que ir lá
experimentar! "..."É muito bom!“... Não é assim que a gente faz
frente ao amigo querido?
Mas pode ser que
ele, mesmo desejoso, tenha um impedimento. Se for financeiro, eu pago... Se for,
por exemplo, porque é diabético e não pode comer doce, vou lamentar e sofrer por
e com ele. Mas se ele rejeitar a minha proposta sem sequer manifestar a
curiosidade de experimentar, ficarei muito triste e preocupado querendo saber o
que acontece com esse amigo.
Entre os que provam
a tortinha, alguns gostam e com estes terei algo mais em comum para
compartilhar. Mas pode ser que alguns provem e não gostem da tortinha ou mesmo
digam "existe algo melhor", como aconteceu com uma aluna que, quando
eu falava dessa história, disse: "O
senhor fala bem dessa tortinha porque não provou o doce de maçã".
Fiquei provocado, isto é “pró + vocado”, instigado a reverificar minha vocação,
e fui provar o tal doce. Bonzinho... mas continuo preferindo a tortinha de
morango. Esta divergência não é ruim. Agora, com essa aluna posso manter um
delicioso diálogo sobre doces. Oxalá este debate nos ajude a amadurecer as
nossas próprias convicções ou descobrirmos juntos algo ainda melhor! Agindo
assim compartilhamos o que se chama de "ímpeto de felicidade" que corresponde
a uma das exigências fundamentais do coração humano.
Compartilho essa
experiência para mostrar como vivo as minhas convicções religiosas, também
quando trato da Ética e da Bioética. Sem isso, seria como um professor de
gastronomia que, falando sobre doces e salgados, não contasse suas preferências.
Seria trair os amigos, privá-los do melhor.
Nada mais
significativo na minha vida do que o encontro com Cristo que se apresenta como
o ponto de referência para tudo, que me provoca a retomar a cada novo dia o que
significa para minha vida o Seu Nascimento, Vida, Morte e
Ressurreição. Claro que esse Anúncio, o compartilhar desse “conhecimento”,
deve respeitar minhas responsabilidades frente à necessária objetividade do meu
trabalho, que é ensinar o conteúdo próprio da disciplina, e respeitar a pessoa
do outro, aluno ou amigo, o que implica em não lhe impor goela abaixo, contra a
sua vontade, mesmo uma porçãozinha da “tortinha de morango”; isso seria
"proselitismo” do tipo fundamentalista. Mas, ao mesmo tempo em que não
posso impor, sou impelido a comunicar àqueles que o Senhor me confiou o
significado para minha vida de um Acontecimento, uma evidência
fundamental.
Quanto mais gosto
de uma pessoa e reconheço seu valor e sua dignidade, isto é, reconheço que é
filho ou filha de Deus e que sua dignidade independe das escolhas que faz
–certas ou erradas – mais desejo comunicar aquilo que de melhor encontrei. Se
não é assim é como aceitar que um irmão se contente com a "tortinha de
morango" mequetrefe vendida num lugar qualquer.
Jornal "O São Paulo", edição 3153, 31 de maio a 6
de junho de 2017.
É muito bom conhecer o que se julga ser a melhor tortinha de morango e ter o gosto e a vitalidade para divulgá-la!
ResponderExcluirComo tortas de morango são a minha paixão, quando for a São Paulo vou convidá-lo a me apresentar a sua. E com a sua companhia de brinde, ah... isso fica imperdível... Saudades, amigo querido.
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