Ilustração: Sergio Ricciuto Conte |
Magna Celi Mendes da Rocha é doutora em Educação: Psicologia da Educação pela PUC-SP, é assessora da Pastoral Universitária da PUC-SP e membro da comunidade católica Shalom. É mãe de quatro filhos.
Estereótipos, rótulos, fôrmas
são, na melhor das hipóteses, tentativas de simplificar e compreender a
realidade que nos cerca. Quando
conseguimos caracterizar, categorizar, definir, classificar parece que a
complexidade torna-se menos assustadora e assim, adquirimos certo domínio sobre
os fenômenos.
Quando o assunto é maternidade,
ao menos em um primeiro momento, trata-se de um tema menos complexo. Afinal, no
mundo ideal, “Mãe é tudo igual, só muda o endereço”. Adjetivos relacionados à
maternidade não faltam: ternura, bondade, desprendimento, amor, dedicação,
confiança. No mundo real, podem existir ainda outros: medo, insegurança, culpa,
abandono, rejeição, maus-tratos, indiferença, revolta.
Em geral, compreendemos com
tranquilidade que cada filho é único. Porém, ainda resistimos em aceitar que
cada mãe é igualmente única. Uma mulher, situada em um tempo e um espaço, com
história pessoal própria e uma gama de potencialidades e limites que são postos
em cheque a cada instante. A maternidade
é, portanto, uma experiência única, situada no aqui e no agora. Nunca uma vivência a-histórica.
Se em outros tempos, por exemplo,
as mulheres eram reconhecidas, sobretudo, pela sua capacidade reprodutiva, hoje
estamos diante de um quadro em que parece uma ofensa romper a barreira do
segundo filho, de modo que as novas gerações sentirão dificuldade em
compreender a expressão “Igual coração de mãe: sempre cabe mais um.”
Mulher não é tudo igual. Mãe não
é tudo igual! Viver a maternidade conscientemente requer tomar parte daquilo
que nos constitui, tanto no âmbito pessoal como comunitário. Compreender aquilo
que nos constitui não apenas para conformar-se com ele, nem para justificar-se e esconder-se, mas
também para avaliar o que realmente nos edifica. Decidir sobre o tipo de mãe
que queremos ser, ainda que alguns duvidem, está ao nosso alcance.
A maternidade é inevitavelmente
uma via de dores e alegrias, cruz e ressurreição. O mesmo filho que nos faz
rir, também nos faz chorar - quase sempre não intencionalmente - mas essa é uma
via da qual dificilmente escapamos.
A via da reconciliação faz-se,
portanto, também necessária. Reconciliar-se com a própria história de vida e, a
partir dela, alçar novos horizontes é uma possibilidade humana que não devemos
desperdiçar. Uma reconciliação que consiste em admitir falhas e erros de outros
e os próprios. Da mãe que tivemos e da que somos ou seremos.
Reconciliação que significa,
ainda, substituir as lentes da (auto)crítica e do (auto)julgamento, pelas
lentes da gratidão e do reconhecimento, sob a pena de sermos esmagados pelo
fardo da busca de uma perfeição inalcançável aos humanos.
Mesmo Aquela que muitos temos
como referencial de Mãe também era única. Podemos nos espelhar, admirar,
desejar suas virtudes, mas, ainda assim, nos apropriaremos delas de maneira
original e nunca da mesma forma.
Portanto, ousemos ser mais nós
mesmas, com nossas fraquezas, limitações, alegrias, medos e esperanças. Ousemos amar nossos filhos com um
amor livre, desinteressado, grato e feliz. Renunciemos ao fardo de acertar
sempre, sendo sempre mais originais e autênticas, renunciando aos rótulos ou estereótipos. Afinal, “Mãe só tem uma!”
Jornal "O São Paulo", edição 3150, 10 a 16 de maio de 2017.
Nenhum comentário:
Postar um comentário