segunda-feira, 4 de maio de 2015

A pessoa humana permanece sempre preciosa

Ilustração: Sergui Ricciuto Conte
Dalton Luiz de Paula Ramos é professor titular de Bioética da USP, membro da Pontifícia Academia para a Vida do Vaticano e conselheiro do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP.

Em 1993 o Santo Papa João Paulo II retomou o projeto, interrompido com o atentado à sua vida de 1981, de criar a Pontifícia Academia para a Vida - dedicada a estudar, informar e formar acerca dos principais problemas de biomedicina e de direito, relativos à promoção e à defesa da vida, sobretudo na sua relação direta com a moral cristã e as diretrizes do Magistério da Igreja. 
Para cuidar da tarefa de estruturar esta Academia, o Papa  polonês contatou um amigo, o médico francês Jérôme Lejeune,  geneticista que descobriu o gene responsável pela Síndrome de Down. Numa conversa telefônica o Papa pede a ele a tarefa de organizar esta Academia. Lejeune lhe informa que está com câncer, em seu leito de morte e que por isso seria melhor pedir a outro, ao que o Santo Papa lembra-lhe que a vida, até o seu último momento, tem um significado e uma missão a cumprir. Jérôme Lejeune aceita a tarefa, organiza a Academia, que é instituída em fevereiro de 1994, sendo nomeado seu primeiro Presidente. Dois meses depois Lejeune falece, sem ter tempo de participar da primeira das reuniões da Academia.
Anualmente esta Academia promove reuniões onde cientistas reconhecidos mundialmente, dedicados ao estudo das ciências médicas e da vida, debatem temas bioéticos atuais, num exemplo de diálogo entre fé e ciência. No início de 2015, na 21ª Reunião Anual, o tema foi “Assistência ao idoso e cuidados paliativos”.
Cuidados paliativos representam a atenção a pacientes para os quais não se encontram mais tratamentos, com prognóstico de morte a curto ou médio prazo. Estes cuidados servem para tornar o sofrimento mais suportável e assegurar ao paciente um adequado acompanhamento humano.  No Discurso que proferiu aos participantes desta Reunião, em 5 de março de 2015, o Papa Francisco proclama que “Os cuidados paliativos são expressão da propensão humana para cuidar uns dos outros, sobretudo dos que sofrem. Eles testemunham que a pessoa humana permanece sempre preciosa, mesmo quando está marcada pela velhice e pela doença. Com efeito, a pessoa, em qualquer circunstância, é um bem para si mesma e para os outros e é amada por Deus. Por isso, quando a sua vida se torna frágil e se aproxima a conclusão da existência terrena, sentimos a responsabilidade de a assistir e acompanhar da melhor maneira.”
Os cuidados paliativos em idosos doentes apresentam particulares dificuldades. Uma delas é proporcionar à sua família um apoio adequado, enquanto coparticipante das dores e necessidades do idoso.
No plano das políticas públicas, e na linha da Doutrina Social da Igreja, cabe aos governantes e à legislação viabilizar recursos, quer seja na forma de liberação de subsídios - financeiros e de acesso a pessoal especializado de apoio - quer seja na forma de leis que protejam e liberem o familiar para atuar como cuidador.
No plano pastoral, as necessidades espirituais se referem à busca de significado e à necessidade, da pessoa idosa enferma e de seus familiares, de serem apoiados na esperança. Entre os diversos elementos que incidem nessa atitude de esperança está a proximidade de pessoas que evitam o abandono e o isolamento, e que ajudam a resgatar o significado da vida. Nesse sentido, a responsabilidade é de todos nós da Comunidade Cristã, para que testemunhemos uma amizade, em Cristo, que recupera o significado da vida até seu último momento, como o fizeram S. João Paulo II e Jérôme Lejeune.  
Jornal “O São Paulo”, edição 3048, de 29 de abril  a 5 de maio de 2015.

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